domingo, 9 de agosto de 2015

Digestão

A. Massa chegou em casa após um cansativo dia de trabalho. Após o banho preparou a refeição, fritando hambúrguer, esquentando arroz, uma simples salada. Sua mente aos poucos ia se desligando do dia: as ligações, as multitarefas, as cobranças. A adrenalina no sangue diminuía. Mesmo assim continuava com um olhar distante. Estava em piloto automático. Sentou-se no sofá, equilibrou o prato e ligou a televisão.
Um corte na carne, apresentação das principais notícias do jornal. Uma garfada, informações sobre violência no Rio. Trêmulo, aproximou o garfo da boca. Notícias do tempo, mais calmo deu uma mordida. Quase não piscava. Com rapidez engolia os alimentos. De tão desconcentrado os largos pedaços desciam com dificuldade pela garganta empurrados pelo refrigerante.
A informação também era difícil de engolir, de assimilar. Bastidores da política de Lizarb: intrigas, corrupção. O amargo da rúcula lhe invadia as pupilas. A economia e suas antigas novidades: crise e desemprego.
Uns 5 minutos e já acabara. Como seria a digestão de tão veloz refeição? Haveria tempo para absorver os nutrientes? Momento para uma sobremesa: iogurte. Notícias do esporte: grandes clubes, grandes contratos, entrevistas com jogadores e técnicos. Eles esbanjavam saúde. Ele tentava os imitar... Se jogava? Sim. Da mesa do escritório para o sofá, depois para a cama. Sedentário sentia o sabor do morango adocicando a boca.
Uma notícia relâmpago sobre alguma descoberta científica. Mal falavam dos pesquisadores (era um tratamento quase tão importante quanto ao dado aos jogadores). Encerramento da edição. A. Massa continuava em um estado pouco reativo, não conseguia questionar e absorver as informações.

Algumas horas depois e ainda estava estufado. Dor de barriga. Era uma pena. No vasto banquete de idéias, havia pouco tempo para refletir, estabelecer relações, conectar conceitos, apreciar sentimentos, desfrutar memórias, saborear versos, deglutir textos. A. Massa se contentava com alimentos pouco nutritivos: cachorro-quente, hambúrguer. Tudo semi-pronto, já preparado. Não queria, nem conseguia criar novos pratos, novas perguntas, novas oportunidades.

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